29 de setembro de 2012

Quando a rua diz não, é não

Novos tempos exigem novas energias e novos desafios. Somos um país que ficou demasiado tempo imobilizado, e daí ter saído em massa à rua para “indignar-se”. Muito tempo em modo passivo, assistindo expectante, ao mesmo tempo que sucessivos governos geriam o pior possível a nossa riqueza coletiva, vulgo os nossos impostos. Trabalhamos, suamos, sofremos na pele, pagamos, e no fim, fomos verificar que a dívida do Estado era mastodôntica. E é incrível verificar que, enquanto vimos desfilar pela frente dos nossos olhos as SCUT, o RSI, os portáteis Magalhães, fundações inúteis, enfim, todo o tipo de medida que enche a vista de políticas sociais improdutivas, subsidiárias, dependentes, poucos foram aqueles que, durante demasiado tempo, se indignaram contra estas políticas erradas. Houve velhos do Restelo que levantaram as suas roucas vozes, e depressa foram rotulados de “invejosos” (?). A dependência extrema do Estado levou a uma inércia sem precedentes dos privados. O Estado pantanoso de que Guterres teve medo e fugiu, levou Barroso a procurar conforto na Europa, não se aborrecendo mais com o estado do país. Em suma, aceitamos calados que nos esvaziassem o futuro. Opções, esperanças, entre outras coisas!
O país saiu à rua porque durante demasiado tempo tolerou as políticas erradas que foram implementadas em Portugal. Partidos houve demasiado tempo no poder. E bem podemos culpabilizar os líderes da oposição de então por não terem sido capazes de criarem uma alternativa forte e credível, com sentido de futuro, Barroso por exemplo.
Mas não só. Hoje o país quer acordar. Levará o seu tempo. O protesto do passado dia 15 de setembro não foi apenas contra o governo atual. É muito mais profundo e complexo.
O país precisa acordar e tomar o caminho do banho frio. Portugal, por vezes, lembra-me aquele país pantanoso que já Eça de Queirós descrevia há 150 anos. Ao reler algumas páginas queirosianas, revejo o país atual. Pouco mudou. A mentalidade reacionária está entre nós. Dizem-me que alguns têm medo do futuro. Pois sim, claro que sim. Somos um povo com pouco acesso ao conhecimento e à informação. Preferimos, alguns, as Gabrielas, os Secret Stories, os talk shows que anunciam o fim dos tempos, as namoradas do Ronaldo. Preferimos gestores incompetentes, que fogem do país, aos Belmiros que fomentam emprego e geram riqueza. Não gostamos de ler Krugman. Muito menos de nos informarmos sobre o que se vai passando no mundo, para sermos mais combativos na nossa performance. Aplaudimos qualquer um que nos fale de empreendedorismo e inovação. Mas o que fazem depois é estender a mão à espera do subsídio, pois empreendedorismo, inovação, mudança, e competitividade é igual a dinheiro que o Estado nos dá. Dinheiro fácil. Depois… Bem, depois logo se vê: o Estado dará mais. E foi mais ou menos isso que esteve em jogo na rua no dia 15 de setembro. São centenas de milhares de portugueses que querem um país diferente. Um país eficaz. Um país ético. Um país sem medo. Um país produtivo. Um país decente. Um país liberto de todo um status quo que vigorou nas últimas décadas e que jaz moribundo no exterior. Um país sem os traumas de Salazar. Um país sem a ameaça dos coronéis e dos capitães. Quero – queremos - um país livre na iniciativa, na escolha, na decisão. E o pior que nos poderia acontecer amanhã, mesmo que se trate de tangente probabilidade, seria que um líder da oposição mal preparado, herdeiro da incompetência e do despesismo, viesse a governar-nos, mais os partidos à sua esquerda. Seria um retrocesso mais ou menos de vinte anos! E a isso, a rua também disse não!

in Açoriano Oriental, 27 de setembro de 2012

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