19 de julho de 2012

Era uma vez Wall Street

Publicado em Açoriano Oriental, 5ª feira, 18 de julho de 2012


Até podemos andar distraídos, mas é muito fácil percecionar o rumo que as grandes questões económicas globais têm tido nas últimas décadas. Dificilmente há um dia ou hora que não sejamos atomizados por estes temas através de toda a fonte noticiosa disponível. E, claro, até nos livros!

Dambisa Moyo reescreveu, em 2010, o que já outros escreveram há décadas: que o Ocidente está decadente e que as novas potências emergentes são uma ameaça real ao status quo global de que fomos líderes durante séculos.

Francis Fukuyama escrevera já que o século XX fez dos ocidentais “profundos pessimistas históricos”, distinguindo, contudo, daquilo que foram as concretizações das nossas expetativas individuais. E em boa verdade o escreveu, pois as gerações que se seguiram à 2ª Guerra Mundial até aos nossos dias, foram as que mais beneficiaram dos recursos naturais e financeiros colocados à disposição dos povos. Numa palavra, durante a segunda metade do século XX, parecíamos viver um karma de prosperidade que não acabaria nunca.

Cultura “sedução non stop”, versus vazio permanente, do “se eu ao menos pudesse sentir alguma coisa?”, ou o sentir, pessoano aliás, tudo de todas as maneiras, marcam já o discurso, também ele inaugural, de Gilles Lipovetsky, e abre um debate sobre o que é o modernismo e o pós-modernismo, de como nos apropriamos destes conceitos e de como nos afastamos deles para criar um supra conceito sobre o qual ainda entendemos pouco.
Mas também Fareed Zacaria.

Fareed Zacaria é indiano e é, pelo menos era, consultor próximo do presidente Obama. Há uns anos atrás defendeu que finalmente assistíamos ao crescimento global genuíno, o mesmo é dizer que o Ocidente rico e avançado começava a perder a sua influência no mundo, sobretudo junto dos países emergentes, e que muitos desses países deixaram de ser meros observadores e tornaram-se membros de pleno direito da nova ordem mundial.

E, a ser verdade, o que uns e outros escreveram ao longo dos últimos trinta anos, Dambisa Moyo reforça essas mesmas ideias no livro A Decadência do Ocidente, e explica como progressivamente perdemos (Ocidente) a nossa influência e a nossa supremacia um pouco por todo o lado, e de como os Restantes - os emergentes, liderados pela China, e que conta nas suas fileiras com países como Rússia, Brasil, Índia, Irão, etc - foram ganhando peso e constituem hoje uma ameaça monetária e industrial ao nosso mundo quase idílico, ou que foi já, e não é mais.

Estes assuntos deixaram de ser do domínio fechado dos pessimistas crónicos, ou “históricos” como lhes chama Fukuyama. São temas frescos, atuais e factuais, e ocupam já muito tempo de antena dos líderes mundiais nas cimeiras em que participam. E, por arrastamento, consomem já o nosso tempo também. Não acredito que seja o fim do mundo, ou o fim da história tal como a conhecemos, mas estes são alertas para serem levados muito a sério, sem filtros de arrogância ou prepotência ocidental.

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